O massacre de cristãos-novos e a Lei de Naturalização de descendentes de sefarditas
Em 2020 comemoram-se cinco anos da aprovação do Decreto-Lei n.º 30-A-2015, que permite a concessão da cidadania portuguesa aos descendentes de judeus sefarditas, ou seja, às pessoas que têm entre seus antepassados vítimas da perseguição promovida pela Inquisição moderna. Mais do que um direito, a Lei é uma reparação histórica em decorrência de eventos lamentáveis que ficaram registrados na história portuguesa e devem ser lembrados para que jamais venham a se repetir.
Segundo estimativas, mais de 100 mil judeus entraram em Portugal a partir de 1492, sendo inicialmente tolerados pelo rei D. Manuel I. Contudo, quatro anos depois, no final de 1496, sob pressão das elites ibéricas, o monarca resolveu dar uma guinada em sua postura e estabeleceu a obrigatoriedade de conversão em massa dos judeus em território português, iniciando um novo período de êxodo, perseguições e intolerância por parte da população com a promoção do Estado e do Igreja.
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Um dos episódios mais sangrentos do período de perseguição ocorreu há exatos 514 anos, no domingo de páscoa, 19 de abril de 1506, quando os fieis rezavam no Convento de São Domingos, em Lisboa, pelo fim da seca e da peste. Após uma agitação iniciada quando alguém afirmou ter visto o rosto de Cristo iluminado no altar, interpretando o fenômeno como um milagre, um cristão-novo (judeu convertido ao catolicismo) tentou explicar que se tratava apenas de um reflexo de luz e acabou sendo espancado até a morte pela multidão.
O fato foi o estopim para que uma turba de centenas de pessoas saíssem às ruas chacinando cristãos-novos sem distinção, sob a alegação de que seriam os culpados pela seca, peste e pela fome que assolavam o país. Com o incentivo dos frades dominicanos, que prometiam 100 dias de absolvição dos pecados para “quem matasse os hereges”, os lisboetas invadiram e saquearam casas e arrastaram famílias inteiras para as ruas, onde eram torturadas e atiradas às fogueiras, sem distinção de sexo ou idade. A “Matança da Páscoa de 1506”, “Massacre de Lisboa” ou “Pogrom de Lisboa” seguiu até o dia 21 de abril e as estimativas é de que quase dois mil cristãos-novos tenham sido assassinados.
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Assim como todo trauma, o episódio é pouco lembrado pela história nacional e, como tal, refletir sobre ele possibilita que seja superado. Isto é o maior mérito do Decreto-Lei n.º 30-A-2015, mais ainda do que sua justificativa como reparação histórica. A maturidade de um povo revela-se em sua capacidade de aprender com os erros de seus antepassados.
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